terça-feira, 28 de agosto de 2012

HISTÓRIA DO DESIGN


2. Design no Século XIX
  2.1 O Design Vitoriano 1835 a 1903
  A Rainha Vitória (1837-1907) da Grã Bretanha marcou uma era muito importante para a cultura inglesa: a Era Vitoriana. No seu reinado as artes, as ciências e a tecnologia foram desenvolvidas em um espaço de tensão entre a tradição do passado e a modernidade. O estilo vitoriano, do qual os ingleses se orgulharam, se estendia aos objetos, móveis,roupa , tecidos, gráfica, arte, arquitetura, paisagismo e design de interiores. Sua influencia chegou a muitos outros continentes e durou mais de um século.  
Ambientes  vitorianos
  O pensamento de John Ruskin (1819-1900), crítico de arte e medievalista, as obras de A.W. Pugin (1812-1852) arquiteto e designer e de William Morris (1834-1896) tiveram uma grande influencia sobre o design vitoriano. Todos eles proclamaram a importância da relação entre arquitetura e design que existia na cultura clássica greco-romana e medieval. Este saudosismo de tempos passados, era parte da cultura romântica da época, mas também revelava o medo do presente e do futuro cada vez mais tomado pelas máquinas de ferro.
  A sociedade industrial era orgulhosa do progresso material que trazia a Revolução Industrial. Mas muitos pensavam que este progresso material deixava de lado as preocupações espirituais e que assim ameaçava o tecido social. Ruskin encontrava na arte a possibilidade de devolver o equilíbrio entre o progresso material e espiritual. Ele escreveu muitos livros de história e crítica de arte que o gosto vitoriano encontrava moralmente edificante. Estes livros instruíram á classe média britânica na idéia da arte como reflexo das condições morais de uma sociedade: "o sinal visível da virtude nacional".(EFLAND, A., 1990).
  Ruskin via a arte como a imitação da natureza, além disto devia proporcionar também prazer. Mas aquilo que tornava um objeto em uma obra de arte era o propósito moral: a maior quantidade de grandes idéias. Para Ruskin as obras de arte são encontros com as grandes idéias. Por causa disto ele defendia a importância de viver em ambientes altamente estéticos
Sala medieval organizada por A.W. Pugin, Exposição Universal de 1851, Londres
  O arquiteto Pugin levou as idéias de Ruskin ao plano do design. Como Ruskin, Pugin propunha um design baseado na utopia regressiva do retorno à beleza da natureza, em oposição ás novas tendências que exaltavam a beleza das máquinas. Eles sentiam aversão pelas tendências arquitetônicas marcadas pelo Palácio de Cristal.  Para Ruskin e Pugin a beleza devia expressar uma função social: "só pode ser belo aquilo que é bom", esta era uma idéia medieval que explicava a beleza como a materialização do bem. (ECO, U.2007)
  Nas artes, o movimento Pré-rafaelista , que tentava retornar á simplicidade e sinceridade da arte foi o que melhor representou a estética e moral vitoriana.   
  O gosto vitoriano cresceu no coração da burguesia britânica do século XIX. Na arquitetura, na decoração, no paisagismo e nas artes gráficas e nos objetos predominaram as formas orgânicas estilizadas de linhas marcadas e osarabescos com decoração austera e volumes geométricos.
A diferença entre a locomotiva inglesa e a norte-americana é a diferença entre esconder as formas da máquina ou evidenciá-las.
  2.2. O movimento Arts and Crafts
William Morris, design gráfico para livro
   Assim como para Ruskin e Pugin, para William Morris oretorno ao sistema dos grêmios da Idade Média e o retorno à vida em contato com a natureza eram as únicas saídas da alienação das metrópoles, da fria e artificiosa beleza do ferro, da produção industrial em série e da miséria causada pela exploração e pelo trabalho mecanizado das fábricas (ECO, 2007).
  Movido por estas idéias iniciou o movimento Arts and Crafts (Artes e Ofícios) e fundou em 1861 junto ao arquiteto Philiph Webb e outros associados, um estúdio de design com o propósito de restabelecer os laços entre o trabalho belo e o trabalhador e voltar á honestidade do design que a produção em massa negava. O estúdio de Morris e Webb ficou conhecido pela idéia da casa como uma obra de arte total, com todos os objetos desenhados pelos arquitetos e realizados por artesãos experientes usando métodos tradicionais e se inspirando na natureza.
Charles F. Annesley Voysey
  O design do movimento Arts and Crafts se caracterizou pela:
  • simplicidade vs. complexidade no ornamento
  • sistema de grêmios vs. sistema industrial
  • acabado artesanal vs. acabado industrial
  A missão social do movimento era dar solução aos males da Revolução Industrial: melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, levar a cultura a todos e restabelecer aunião das artes e os ofícios perdida desde o Renascimento.
  Todas as peças feitas nos estúdios do Arts and Crafts seguiam os princípios estabelecidos por Morris:
  • considerar o material (qualidade e nobreza)
  • considerar o uso (função)
  • considerar a construção (design)
  • considerar a ferramenta (técnica)
  
 
Charles Robert Ashbee
  O movimento Arts anda Crafts de Morris teve o apóio da monarquia vitoriana e teve grande sucesso entre a burguesia rica. A marca registrada da oficina de Morris e arquitetos era a alta qualidade artesanal dos produtos. Isto encarecia muito os objetos frente àqueles que produziam as fábricas. O sonho de Morris de oferecer ambientes e objetos altamente estéticos a todos não era possível. Só os ricos podiam comprá-los. Mas o gosto pelos objetos Arts and Crafts cresceu e se estendeu na Alemanha e nos Estados Unidos onde se publicaram revistas especializadas que atingiam um grande público feminino.
Design de interiores 1884 para a revista Arts and Crafts de Munich,Alemanha
 
Catalogo de cadeiras Thonet
  As idéias do movimento Arts and Crafts, os ventos românticos e a veloz modernização da Europa no final do século XIX inspiraram na França um movimento ainda maior e mais abrangente.
  2.3. O Modernismo ou Art Nouveau 1890 - 1918
 
Cartazes: Toulouse Lautrec para jane Avril e Alphonse Mucha para cigarros JOB
  O movimento do Art Nouveau se iniciou na França e se expandiu por toda a Europa convertendo-se em um estilo internacional. Em inglês se conheceu como Modern Style, em espanhol e português como Modernismo, em alemão como Jugenstil e em italiano como Liberty ou Estilo Floreale.
  Este movimento esta estreitamente ligado às correntes artísticas de fim de século que promoveram a imaginação, a expressão e o simbolismo na arte, mas também à produção industrial em série e ao uso de materiais modernos como o ferro, vidro e cimento. À diferença do movimento Arts and Crafts, o movimento francês do Art Nouveau valorizava a racionalidade da ciência e da engenharia e acompanhava o crescimento da burguesia. Era uma nova geração que tinha nascido e crescido nas metrópoles. Desta maneira o Art Nouveau estabeleceu uma articulação estreita entre arte e indústria resultando numa alta qualidade estética dos objetos.
  O Art Nouveau foi o primeiro fenômeno de moda em que as tendências da arte era aplicadas aos objetos. Moderno significa novo, atual. A moda é uma novidade que toma conta de todos os aspectos da vida. Isto foi possível no contexto de uma sociedade que já contava com uma rápida propagação das idéias e os costumes pelos meios de transporte e comunicação e que contava com um mercado entusiasmado pelo consumo das novidades modernas.
  As linhas curvas, os arabescos, as formas orgânicas e geométricas e os motivos florais que caracterizaram o estilo do movimento Arts and Crafts se fizeram mais atrevidas e sensuais no Art Nouveau. Arquitetura, móveis, objetos, jóias, roupa, máquinas, móveis urbanos, tudo se vestiu de linhas onduladas como as entradas do Metrô  de Paris de Henry Guimard ou o Parque Guell de Gaudi. Era uma geração que aceitava a máquina, mas a vestia de adornos floridos para naturalizá-la. A máquina de costura Singer, que foi uma das peças mais vendidas na história do comércio e que até hoje funcionam em alguns cantos domésticos do mundo, são a evidencia do desejo de esconder a frieza do ferro e das máquinas com formas e ornamentos que lembravam a natureza. Era a forma que os modernistas tinham encontrado para aceitar o peso da civilização industrial e que os idealistas ingleses do Arts and Crafts recusavam assimilar.
 
Máquina de costura SINGER e publicidade
  Sendo uma continuação do movimento inglês, compartilhou muitas das características estilísticas, mas devido a sua visão otimista do progresso moderno e á sua ligação com a corrente artística do Simbolismo o movimento Art Nouveau foi muito mais sensual e alegre, muito mais glamoroso e atrevido, muito menos preocupada com o sentido moral e mais com o sentido estético e tecnológico. Enquanto o movimento do Arts and Crafts era idealista, o Art Nouveau era positivista.
  Estas são suas características estilísticas:
  • União entre natureza e artefato
  • estilização figurativa
  • Uso de figuras femininas
  • Padrões florais
  • Formas orgânicas e geométricas
  • Cores planas e pasteis
  • Linhas curvas
  • arabescos
  • Originalidade
  Do movimento participaram arquitetos como o espanhol Gaudi, o artista francês Henry Tolouse Lautrec, o designer gráfico e artista inglês Aubrey Beardslay, o arquiteto inglês Machmurdo, o arquiteto belga Victor Horta, o artista austríaco Gustave Klimt, o designer gráfico checo Alphonse Mucha e o francês Jules Cheréte junto a muitos outros mais.
 
Gustave Klimt, "Hygieia" 1907 , Aubrey Beardsley "O mando do Pavão" 1894
  Houve um grande desenvolvimento do design gráfico com o surgimento dos cartazes coloridos, que agora eram possíveis com a litografia  (gravura com matriz de pedra). A vida noturna, boêmia, artística e consumista das metrópoles exigia  por primeira vez uma imensa produção de publicidade e propaganda. Os desenhos eram feitos à mão e a fotografia era usada como base do desenho realista e decorativo. A tipografia seguia uma expressividade manual que lhes deu uma visualidade muito audaz e moderna.
 
Tolouse Lautrec e Edward Penfield
  O nome de Belle Èpoque corresponde a uma época de grande otimismo no futuro da civilização. Uma onda positiva que deu origem ao pensamento Positivista  na filosofia de ocidente (ver também materialismo, evolucionismo, marxismo e determinismo na filosofia) e na perspectiva dos que desfrutavam dos prazeres e luxos da modernidade. Mas o que acontecia nas ruas pobres de Paris e de outras metrópoles européias estava longe de ser uma bela época, a situação iria detonar em poucos anos as certezas da razão que na época se encontrava na ciência, nas máquinas e no sistema de produção capitalista. O Art Nouveau foi um sucesso enquanto durou a Belle Époque mas se restringia às ruas dos bairros ricos e ao consumo da burguesia ascendente. Na virada do século com a iminência de uma guerra de grandes proporções o movimento diminuiu a sua força. Com a Primeira Guerra Mundial o movimento se centrou nos Estados Unidos e nos anos 20 derivou no estilo decorativo chamado Art Deco.
  No Brasil a arquitetura e os objetos Art Nouveau ou Modernistas chegaram no começo do século XX com as muitas novidades modernas de Ocidente. Em São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus se levantaram obras arquitetônicas das quais só restam algumas como a casa Vila Penteado desenhada por Carlos Eckman e que agora é a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
 
Vila Penteado São Paulo e casa Vilino Silveira
  O movimento artístico Modernista da Semana de 22 não faz parte desta influencia. Ela tem origem nas correntes artísticas da segunda década do século XX. Embora originadas no Art Nouveau ou Modernismo a Arte Moderna do seguinte século difere em propósito e estética daquela que floresceu na Belle Èpoque.
‘A jovem indústria européia, à procura de uma estética complacente e complacida, encontra no  Modernismo uma forma de representação orgânica que desde a arquitetura ao livro, do mobiliário à joalheria, dos objetos de uso cotidiano à escultura decorativa ou ao cartaz, proporciona uma resposta plástica coerente e amável, à exata e precisa medida das suas ambições pequeno-burguesas”. (tradução minha)
"El diseño gráfico, desde los orígenes hasta nuestros días", por Enric Satué

  Fontes:
BURDEK, Bernhard E. Diseño: Historia, teoría y práctica del diseño industrial. Barcelona: Gustavo Gili, 1994..
ARGAN, Giulio Carlo. Historia da Arte Moderna, do Iluminismo aos Movimentos Contemporâneos Companhia das Letras, São Paulo, 1992.
ECO, Umberto. História de la Belleza. Barcelona: Editora Lumen. 2007.
  
    
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