Masaccio:
Cristo e o tributo, 1425-1428. Capela Scrovegni
Rafael:
A Escola de Atenas, 1509. Vaticano
Sucintamente, a contribuição maior da
pintura do Renascimento foi sua nova maneira de representar a natureza, através de domínio tal sobre a técnica pictórica e a
perspectiva de ponto central, que foi capaz de criar uma eficiente ilusão de espaço tridimensional em uma superfície plana. Tal conquista significou um afastamento radical em relação ao sistema
medieval de representação, com sua estaticidade, seu espaço sem profundidade e seu sistema de proporções simbólico - onde os personagens maiores tinham maior importância numa escala que ia do homem até Deus - estabelecendo um novo parâmetro cujo fundamento era matemático, no que se pode ver um reflexo da popularização dos princípios filosóficos do racionalismo, antropocentrismo e do humanismo. A linguagem visual formulada pelos pintores renascentistas foi tão bem sucedida que permanece válida até hoje.
O cânone greco-romano de proporções voltava a determinar a construção da figura humana; também voltava o cultivo do
Belo tipicamente clássico. A pintura renascentista é em essência linear; o
desenho era agora considerado o alicerce de todas as
artes visuais e seu domínio, um pré-requisito para todo artista. Para tanto, foi de grande utilidade o estudo das esculturas e relevos da Antiguidade, que deram a base para o desenvolvimento de um grande repertório de temas e de gestos e posturas do corpo. Na construção da pintura, a linha convencionalmente constituía o elemento demonstrativo e lógico, e a cor indicava os estados afetivos ou qualidades específicas. Outro diferencial em relação à arte da Idade Média foi a introdução de maior dinamismo nas cenas e gestos, e a descoberta do sombreado, ou
claro-escuro, como recurso plástico e mimético.
Giotto, atuando entre os séculos XIII e XIV, foi o maior pintor da primeira Renascença italiana e o pioneiro dos naturalistas em pintura. Sua obra revolucionária, em contraste com a produção de mestres do
gótico tardio como
Cimabue e
Duccio, causou forte impressão em seus contemporâneos e dominaria toda a pintura italiana do
Trecento, por sua lógica, simplicidade, precisão e fidelidade à natureza.
Ambrogio Lorenzetti e
Taddeo Gaddicontinuaram a linha de Giotto sem inovar, embora em outros características progressistas se mesclassem com elementos do gótico ainda forte, como se vê na obra de
Simone Martini e
Orcagna. O estilo naturalista e expressivo de Giotto, contudo, representava a vanguarda na visualidade desta fase, e se difundiu para
Siena, que por um tempo passou à frente de Florença nos avanços artísticos. Dali se estendeu para o norte da Itália.
No
Quattrocento as representações da figura humana adquiriram solidez, majestade e poder, refletindo o sentimento de autoconfiança de uma sociedade que se tornava muito rica e complexa, com vários níveis sociais, de variada educação e referenciais, que dela participavam ativamente, formando um painel multifacetado de tendências e influências. Mas ao longo de quase todo o século a arte revelaria o embate entre os derradeiros ecos do gótico espiritual e abstrato, exemplificado por
Fra Angelico,
Paolo Uccello,
Benozzo Gozzoli e
Lorenzo Monaco, e as novas forças organizadoras, naturalistas e racionais do classicismo, representadas por
Botticelli,
Pollaiuolo,
Piero della Francesca e
Ghirlandaio. Nesse sentido, depois de Giotto o próximo marco evolutivo foi
Masaccio, em cujas obras o homem tem um aspecto nitidamente enobrecido e cuja presença visual é decididamente concreta, com eficiente uso dos efeitos de volume e espaço tridimensional. Dele se disse que foi
"o primeiro que soube pintar homens que realmente tocavam seus pés na terra". Junto com Florença,
Veneza representa a vanguarda artística européia no
Quattrocento, dispondo de um grupo de artistas ilustres, como
Jacopo Bellini,
Giovanni Bellini,
Vittore Carpaccio,
Mauro Codussi e
Antonello da Messina. Siena, que já fizera parte da vanguarda em anos anteriores, agora hesitava entre o apelo espiritual do gótico e o fascínio profano do classicismo, e perdia ímpeto. Enquanto isso também outras regiões do norte da Itália começavam a conhecer o classicismo, através de
Perugino em
Perugia;
Francesco Laurana em
Urbino;
Pinturicchio, Masaccio,
Melozzo da Forli, e
Giuliano da Sangallo em Roma, e Mantegna em
Pádua e
Mântua.Também deve-se lembrar a influência renovadora sobre os pintores italianos da técnica da
pintura a óleo, que no
Quattrocento estava sendo desenvolvida nos Países Baixos e atingira elevado nível de refinamento, possibilitando a criação de imagens muito mais precisas e nítidas e com um sombreado muito mais sutil do que o que era conseguido com o
afresco, a
encáustica e a
têmpera. As telas flamengas eram muitissimo apreciadas na Itália exatamente por essas qualidades, e uma grande quantidade delas foi importada, copiada ou emulada pelos italianos.
Mais adiante, na Alta Renascença, com
Leonardo da Vinci, a técnica do óleo se refinou e penetrou no terreno do sugestivo, ao mesmo tempo em que aliava fortemente arte e ciência. Com
Rafaelo sistema classicista de representação visual chegou a um apogeu, e se revelou a doçura, a grandeza solene e a perfeita harmonia. Mas essa fase, de grande equilíbrio formal, não durou muito, logo seria transformada profundamente, dando lugar ao Maneirismo. Aqui
Michelangelo, coroando o processo de exaltação do homem, levou-o a uma nova dimensão, a do sobre-humano, abrindo-lhe também as portas do trágico e do patético. Com os maneiristas toda a noção de espaço foi então alterada, a perspectiva se fragmentou em múltiplos pontos de vista, e as proporções da figura humana foram distorcias com finalidades expressivas ou meramente estéticas, formulando-se uma linguagem visual mais dinâmica, vibrátil, subjetiva, dramática e sofisticada.
Pontormo,
Veronese,
Romano,
Tintoretto,
Bronzino, e Michelangelo em sua fase madura foram exemplos típicos do Maneirismo plenamente manifesto.
Giorgio Vasari, um pintor e arquiteto maneirista de mérito secundário, também deve ser lembrado por sua importância como biógrafo e historiador da arte, um dos primeiros a reconhecer todo o ciclo renascentista como uma fase de renovação cultural e o primeiro a usar o termo "Renascimento" na bibliografia, em sua enciclopédica
Le Vite de' più Eccellenti Pittori, Scultori e Architettori, uma das fontes primárias para o estudo da vida e obra de muitos artistas do período.
Escultura
Na
escultura os sinais de uma revalorização de uma estética classicista são mais antigos, datando do século XIII.
Nicola Pisano em torno de 1260 produziu um
púlpito para o
Batistério de Pisaque é considerado a manifestação precursora da Renascença em escultura. Na passagem do século XIII para o século XIV seu filho
Giovanni Pisano levaria seu estilo mais longe e dominaria a cena em Florença no primeiro terço do século, e seria um dos introdutores de um gênero novo, o dos
cruxifixi dolorosi, de grande dramaticidade e larga influência, até então incomum na Toscana. Seu talento versátil daria origem a outras obras de suma elegância e austeridade, de linhas limpas e puras, como o retrato de
Enrico Scrovegni. Suas
Madonnas, relevos e o púlpito da
Catedral de Pisa são, por outro lado, muito mais movimentados e graciosos, com elementos góticos mesclados a um novo senso de proporção e espaço que infere seu estudo dos clássicos.Contemporâneos como
Tino di Camaino seguem aproximadamente a mesma linha de trabalho, num cruzamento de correntes que seria típico de todo o
Trecento. Em meados do século
Andrea Pisano se tornaria um dos escultores mais importantes da Itália, autor dos relevos da porta sul do
Batistério de Florença e sendo nomeado arquiteto da
Catedral de Orvieto. Foi mestre de
Orcagna, cujo tabernáculo em
Orsanmichele é uma das obras-primas do período, e de
Giovanni di Balducci, autor de um requintado e complexo monumento funerário na
Capela Portinari de Milão.
Apesar dos avanços dos mestres citados acima, sua obra ainda reflete o embate entre as tendências antigas e modernas, e elementos góticos ainda são nitidamente visíveis em todos eles. Para o fim do
Trecento surge em Florença a figura de
Lorenzo Ghiberti, autor de relevos no
Batistério de São João, onde os modelos clássicos são recuperados por completo. Logo em seguida
Donatello conduz os avanços em várias frentes. Nas suas obras principais figuram as estátuas de profetas do
Antigo Testamento. Deles talvez o
Habacuc seja a mais impressionante, uma imagem cujo porte lembra fortemente um romano com sua
toga, quase extraído diretamente da retratística da Roma republicana. Ousou ao modelar a primeira figura de nu de grandes dimensões em volume completo desde a antiguidade, o
David de 1430. Também inovou na estatuária equestre, criando o monumento a
Gattamelata, a mais importante obra em seu gênero desde o
Marco Aurélio romano do
Capitólio. Por fim, sua descarnada
Madalena penitente, em madeira, de 1453, é uma imagem de dor, austeridade e transfiguração que não teve paralelos em sua época, reintroduzindo um pungente senso de drama e realidade na estatuária que só se viu no
Helenismo.
Na geração seguinte,
Verrocchio se destaca pela teatralidade e dinamismo das composições. Seu
Cristo e São Tomé tem grande realismo e poesia. Compôs um
Jovem com um golfinho para a fonte de Netuno em Florença que é o protótipo da
figura serpentinata, que seria o modelo formal mais prestigiado pelo Maneirismo e Barroco. Sua obra maior, o monumento equestre a
Bartolommeo Colleoni é uma expresão de poder e força mais impressionante que o
Gattamelata.
Desiderio da Settignano e
Antonio Rosselino também merecem lembrança. Florença continuou o centro da evolução até o aparecimento de
Michelangelo, que trabalhou em Roma para os papas - e também em Florença para os Medici - e foi o maior nome da escultura desde a Alta Renascença até meados do
Cinquecento. Sua obra passou do classicismo puro do
David, do
Baco, e chegou ao Maneirismo, expresso em obras veementes como os
Escravos, o
Moisés, e os nus da
Capela Medici em Florença. Artistas como
Baccio Bandinelli,
Agostino di Duccio e
Tullio Lombardo também deixaram obras de grande maestria, como o
Adão deste último. Encerram o ciclo renascentista
Giambologna,
Francesco da Sangallo,
Jacopo Sansovino e
Benvenuto Cellini, com um estilo de grande dinamismo e expressividade, tipificado no
Rapto das Sabinas, de Giambologna. Artistas importantes em outros países da Europa já iniciavam a trabalhar em linhas claramente italianas, como
Adriaen de Vries no norte e
Germain Pilon na França, espalhando o gosto italiano por uma grande área geográfica e dando origem a várias formulações sincréticas com escolas regionais.
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Ghiberti:
A história de José, painel da
Porta do Paraíso, Batistério de São João
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Verrocchio:
São Tomé e Cristo, 1466-83, Orsanmichele, Florença
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Música
Em linhas gerais, a
música do Renascimento não oferece um panorama de quebras abruptas de continuidade, e todo o longo período pode ser considerado o terreno da lenta transformação do universo
modal para o
tonal, e da
polifonia horizontal para a
harmonia vertical. O Renascimento foi também um período de grande renovação no tratamento da
voz e na
orquestração, no
instrumental e na consolidação dos gêneros e formas puramente instrumentais com as
suítes de danças para bailes, havendo grande demanda por animação musical em todo festejo ou cerimônia, público ou privado.
Iluminura do
Codex Squarcialupimostrando Francesco Landini tocando um
organetto
Na técnica compositiva a
polifonia melismática dos
organa, derivada diretamente do
canto gregoriano, é abandonada em favor de uma escrita mais enxuta, com vozes tratadas de maneira cada vez mais equilibrada. No início do período o movimento paralelo é usado com moderação,
acidentes são raros mas as dissonâncias duras são comuns. Mais adiante a escrita a três vozes começa a apresentar tríades, dando uma impressão de
tonalidade. Tenta-se pela primeira vez escrever música descritiva ou programática, os rígidos
modos rítmicos cedem lugar à
isorritmia e a formas mais livres e dinâmicas como a
balada, a
chanson e o
madrigal. Na música sacra a forma da
missa se torna a mais prestigiada. A
notação evolui para adoção de notas de menor valor, e mais para o final do período passa a ser aceito o
intervalo de
terça como
consonância, quando antes apenas a
quinta, a
oitavae o
uníssono o eram.
Os precursores desta transformação não foram italianos, mas franceses como
Guillaume de Machaut, autor da maior realização musical do
Trecentoem toda Europa, a
Missa de Notre Dame, e
Philippe de Vitry, muito elogiado por Petrarca. Da música italiana dessa fase inicial muito pouco chegou a nós, embora se saiba que a atividade era intensa e quase toda no terreno profano, sendo as principais fontes de partituras o
Codex Rossi, o
Codex Squarcialupi e o
Codex Panciatichi. Entre seus representantes estão
Matteo da Perugia,
Donato da Cascia,
Johannes Ciconia e sobretudo
Francesco Landini. Somente no
Cinquecento a música italiana começou a desenvolver características próprias e originais, sendo até então muito dependente da
escola franco-flamenga.
O predomínio de influências do norte não significa que o interesse italiano pela música fosse pequeno. Na ausência de exemplos musicais da Antiguidade para serem emulados, filósofos italianos como Ficino se voltaram para textos clássicos de Platão e Aristóteles em busca de referências para que se pudesse criar uma música digna dos antigos. Nesse processo um significativo papel foi desempenhado por Lorenzo de' Medici em Florença, que fundou uma academia musical e atraiu diversos músicos europeus, e por
Isabella d'Este, cuja pequena mas brilhante corte em Mântua atraiu poetas que escreviam em italiano poemas simples para serem musicados, e lá a récita de poesia, assim como em outros centros italianos, era geralmente acompanhada de música. O gênero preferido era a
frottola, que já mostrava uma estrutura harmônica tonal bem definida e contribuiria para renovar o
madrigal, com sua típica fidelidade ao texto e aos afetos. Outros gêneros polifônicos como a missa e o moteto fazem a esta altura pleno uso da imitação entre as vozes e todas são tratadas de um modo semelhante. Compositores flamengos importantes trabalham na Itália, como
Adriaen Willaert e
Jacob Arcadelt, mas as figuras mais célebres do século são
Giovanni da Palestrina,
italiano, e
Orlande de Lassus,
flamengo, que estabelecem um padrão de para a música coral que seria seguido em todo o continente, com uma escrita melodiosa e rica, de grande equilíbrio formal e nobre expressividade, preservando a inteligibilidade do texto, aspecto que no período anterior muitas vezes era secundário e se perdia na intrincada complexidade do
contraponto. A impressão de sua música se equipara à grandeza idealista da Alta Renascença, florescendo em uma fase em que o Maneirismo já se manifestava com força em outras artes como a pintura e escultura. No final do século aparecem três grandes figuras,
Carlo Gesualdo,
Giovanni Gabrieli e
Claudio Monteverdi, que introduziriam avanços na harmonia e um senso de cor e timbre que enriqueceriam a música dando-lhe uma expressividade e dramatismo maneiristas e a preparariam para o Barroco. Monteverdi em especial é importante por ser o primeiro grande
operista da história, e suas óperas
L'Orfeo (1607) e
L'Arianna (1608, perdida, só resta uma famosa
ária, o
Lamento) representam o nobre ocaso da música renascentista e os primeiros grandes marcos do barroco musical
- Exemplos musicais
-
Arquitetura
A permanência de muitos vestígios da
Roma antiga em solo italiano jamais deixou de influir na plástica edificatória local, seja na utilização de elementos estruturais ou materiais usados pelos romanos, seja mantendo viva a memória das formas clássicas. Mesmo assim, no
Trecento o
gótico continua a linha dominante e o classicismo só viria a emergir com força no século seguinte, em meio a um novo interesse pelas grandes realizações do passado. Esse interesse foi estimulado pela redescoberta de bibliografia clássica dada como perdida, como o
De Architectura de
Vitrúvio, encontrado na biblioteca do mosteiro de
Monte Cassino em 1414 ou 1415. Nele o autor exaltava o
círculo como forma perfeita, e elaborava sobre
proporções ideais da edificação e da figura humana, e sobre
simetria e relações da
arquitetura com o homem. Suas idéias seriam então desenvolvidas por outros arquitetos, como o primeiro grande expoente do classicismo arquitetônico,
Filippo Brunelleschi, que tirou sua inspiração também das ruínas que estudara em Roma. Foi o primeiro a usar modernamente as
ordens arquitetônicas de maneira coerente, instaurando um novo sistema de proporções baseado na escala humana. Também se deve a ele o uso precursor da
perspectiva para representação ilusionística do espaço tridimensional em um plano bidimensional, uma técnica que seria aprofundada enormemente nos séculos vindouros e definiria todo o estilo da arte futura, inaugurando uma fertilíssima associação entre a arte e a ciência.
Leon Battista Alberti é outro arquiteto de grande importância, considerado um perfeito exemplo do "homem universal" renascentista, versátil em várias especialidades. Foi o autor do tratado
De re aedificatoria, que se tornaria canônico. Outros arquitetos, artistas e filósofos acrescentaram à discussão, como Luca Pacioli em seu
De Divina Proportione, Leonardo com seus desenhos de igrejas centradas e
Francesco di Giorgio com o
Trattato di architettura, ingegneria e arte militare.
Dentre as características mais notáveis da arquitetura renascentista está a retomada do modelo centralizado de
templo, desenhado sobre uma
cruz grega e coroado por uma
cúpula, espelhando a popularização de conceitos da
cosmologia neoplatônica e com a inspiração concomitante de edifícios-relíquias como o
Panteão de Roma. O primeiro desse gênero a ser edificado na Renascença foi talvez San Sebastiano, em
Mântua, obra de Alberti de 1460, mas deixado inconcluso. Este modelo tinha como base uma escala mais humana, abandonando o intenso verticalismo das igrejas góticas e tendo na cúpula o coroamento de uma composição que primava pela inteligibilidade. Especialmente no que toca à estrutura e técnicas construtivas da cúpula, grandes conquistas foram feitas no Renascimento. Das mais importantes são a cúpula octogonal da
Catedral de Florença, de Brunelleschi, que não usou andaimes apoiados no solo ou
concreto na construção, e a da
Basílica de São Pedro, em Roma, de Michelangelo, já do século XVI.
No lado profano aristocratas como os
Medici, os
Strozzi, os Pazzi, asseguram seu status ordenando a construção de palácios de grande imponência e originalidade, como o
Palácio Pitti (Brunelleschi), o
Palazzo Medici Riccardi (
Michelozzo), o
Palazzo Rucellai (Alberti) e o
Palazzo Strozzi (
Maiano), todos transformando o mesmo modelo dos palácios medievais italianos, de corpo mais ou menos cúbico, pavimentos de alto
pé-direito, estruturado em torno de um pátio interno, de fachada rústica e coroado por grande
cornija, o que lhes confere um aspecto de solidez e invencibilidade. Formas mais puramente clássicas são exemplificadas na
Vila Medici, de
Giuliano da Sangallo. Variações interessantes deste modelo são encontradas em Veneza, dadas as características alagadas do terreno.
Depois da figura principal de
Donato Bramante na Alta Renascença, trazendo o centro do interesse arquitetônico de Florença para Roma, e sendo o autor de um dos edifícios sacros mais modelares de sua geração, o
Tempietto, encontramos o próprio Michelangelo, tido como o inventor da
ordem colossal e por algum tempo arquiteto das obras da Basílica de São Pedro. Michelangelo, na visão dos seus próprios contemporâneos, foi o primeiro a desafiar as regras até então consagradas da arquitetura classicista, desenvolvendo um estilo pessoal, pois fora segundo
Vasari o primeiro a abrir-se para a verdadeira liberdade criativa. Ele representa, então, o fim do "classicismo coletivo", bastante homogêneo em suas soluções, e o início de uma fase de individualização e multiplicação das linguagens arquitetônicas. Ele abriu caminho, pelo imenso prestígio que desfrutava entre os seus, para que a nova geração de criadores realizasse um sem-número de experimentações a partir do
cânone clássico de arquitetura, tornando esta arte independente dos antigos - ainda que largamente devedora deles. Alguns dos mais notáveis nomes desta época foram
Della Porta,
Sansovino,
Palladio,
Fontana,
Peruzzi e
Vignola. Entre as modificações que esse grupo introduziu estavam a flexibilização da estrutura do
frontispício e a anulação das hierarquias das
ordens antigas, com grande liberdade para o emprego de soluções não ortodoxas e o desenvolvimento do gosto por um jogo puramente plástico com as formas, dando muito mais dinamismo aos espaços internos e às fachadas. De todos os derradeiros renascentistas Palladio foi o mais influente, e ainda hoje é o arquiteto mais estudado em todo o mundo. Foi criador de uma fértil escola, chamada
Palladianismo, que perdurou, com altos e baixos, até o século XX.
A italianização da Europa
Com o crescente movimento de artistas, humanistas e professores entre as cidades ao norte dos
Alpes e a
península Itálica, e com a grande circulação de textos impressos e obras de arte através de reproduções em gravura, o classicismo iniciou em meados do século XV uma etapa de difusão por todo o continente. Mas foram
Francisco I da França e
Carlos V,
Sacro Imperador Romano, que logo reconheceram o potencial da Renascença italiana para promover suas imagens régias através de formas clássicas, os agentes decisivos para a divulgação intensiva da arte italiana além dos
Alpes. Mas isso aconteceu apenas por volta do início do século XVI, quando o ciclo renascentista já tinha pelo menos duzentos anos de amadurecimento na Itália, já chegara a uma culminação e já estava em sua fase maneirista. Destarte, cabe advertir que não houve nada como um
Quattrocento ou uma Alta Renascença no restante da Europa, pois nela não houve um lento e orgânico processo de classicização como o italiano, foi em muito um resultado de eventos políticos que ocorreram em um curto espaço de tempo, mas que tiveram repercussão continental. Como resultado, como se se abrissem de repente as comportas de uma represa, o vasto derrame de cultura italiana para o norte e o oeste depois das invasões na Itália gerou em cada região ou país uma original mescla de raízes locais góticas com o classicismo italiano tardio.
França
A influência renascentista via
Flandres e a
Borgonha já existia desde o
século XV, como se nota na produção de
Jean Fouquet, mas a
Guerra dos Cem Anos e as epidemias de peste atrasaram seu florescimento, que ocorre somente a partir da invasão francesa da Itália por
Carlos VIII em 1494. O período se estende até cerca de 1610, mas seu final é tumultuado com as
guerras de religião entre católicos e
huguenotes, que devastaram e enfraqueceram o país. Durante sua vigência a França inicia o desenvolvimento do
absolutismo e se expande pelo mar explorando a América. O centro focal se estabelece em
Fontainebleau, sede da corte, e ali se forma a
Escola de Fontainebleau, integrada por franceses e italianos como
Rosso,
Primaticcio,
Dell'Abbate e
Toussaint Dubreuil, sendo uma referência para outros como
François Clouet,
Jean Clouet,
Jean Goujon,
Germain Pilon e
Pierre Lescot. Leonardo também esteve presente ali.
Na música houve um enorme florescimento através da
Escola da Borgonha, que dominou a cena musical européia durante o século XV e daria origem à Escola franco-flamenga, que produziria mestres como
Josquin des Prez,
Clément Janequin e
Claude Le Jeune. A
chanson francesa do século XVI teria um papel na formação da
canzona italiana, e sua
Musique mesurée estabeleceria um padrão de escrita vocal declamatória na tentativa de recriação da música do
teatro grego, e favoreceria a evolução para a plena tonalidade. Também apareceu um gênero de
música sacradistinto de seus modelos italianos, conhecido como
chanson spirituelle. Na arquitetura foram deixados monumentos ímpares como o
Castelo de Chambord e o
Château d'Amboise. Na literatura se destacam
Rabelais, um precursor do gênero fantástico,
Montaigne, popularizador do gênero
ensaio onde é até hoje um dos maiores nomes, e o grupo integrante da
Plêiade, com
Pierre de Ronsard,
Joachim du Bellay e
Jean-Antoine de Baïf, que buscavam um atualização vernácula da literatura greco-romana, a emulação de formas específicas e a criação de neologismos baseados no latim e no grego
- Exemplo musical
Países Baixos e Alemanha
Os
flamengos estavam em contato com a
Itália desde o século XV, mas somente no século XVI o contexto se transforma e se caracteriza como renascentista, tendo uma vida relativamente curta. Nesta fase a região enriquece, a
Reforma Protestante se torna uma força decisiva, oposta à dominação católica de Carlos V, levando a conflitos sérios que dividiriam a área. As cidades comerciais de
Bruxelas,
Ghent e
Bruges estreitam os contatos com o norte da Itália e encomendam obras ou atraem artistas italianos, como os arquitetos
Tommaso Vincidor e
Alessandro Pasqualini, que passaram a maior parte de suas vida ali. O amor pela gravura trouxe para a região inúmeras reproduções de obras italianas,
Dürer deixou uma marca indelével quando passou por lá, Erasmo mantinha aceso o Humanismo e Rafael mandava executar tapeçarias em
Bruxelas.
Vesálio faz avanços importantes na
Anatomia,
Mercator na
Cartografia e a nova imprensa encontra em
Antuérpia e
Leuven condições para a fundação de editoras de larga influência.
Na música os
Países Baixos, junto com o noroeste da
França, se tornam o centro principal para toda a Europa através da Escola franco-flamenga. A pintura desenvolve uma escola original, que popularizou a
pintura a óleo e dava enorme atenção ao detalhe e à linha, mantendo-se muito fiel à temática sacra e incorporando sua tradição gótica às inovações maneiristas italianas. Teve em
Jan van Eyck,
Rogier van der Weyden e
Hieronymus Bosch seus precursores no século XV, e logo a região daria sua contribuição própria à arte européia consolidando o paisagismo através de
Joachim Patinir e a pintura de gênero com
Pieter Brueghel o velho e
Pieter Aertsen. Outros nomes notáveis são
Mabuse,
Maarten van Heemskerck,
Quentin Matsys,
Lucas van Leyden,
Frans Floris,
Adriaen Isenbrandt e
Joos van Cleve.
A
Alemanha impulsionou seu Renascimento fundindo seu rico passado
gótico com os elementos italianos e flamengos. Um de seus primeiros mestres foi
Konrad Witz, seguindo-se
Albrecht Altdorfer e Dürer, que esteve em Veneza duas vezes e foi lá profundamente influenciado, lamentando ter de voltar para o norte. Junto com o erudito
Johann Reuchlin, Dürer foi uma das maiores influências para disseminação do Renascimento no centro da Europa e também nos Países Baixos, onde suas célebres gravuras foram altamente elogiadas por Erasmo, que o chamou de "o
Apeles das linhas negras". A escola romana foi um elemento importante para a formação do estilo de
Hans Burgkmair e
Hans Holbein, ambos de
Augsburgo, visitada por Ticiano. Na música basta a menção a
Orlande de Lassus, um integrante da Escola franco-flamenga radicado em
Munique que se tornaria o compositor mais célebre da Europa em sua geração, a ponto de ser nobilitado pelo imperador
Maximiliano II e tornado cavaleiro pelo papa
Gregório XIII, algo extremamente raro para um músico
Portugal
A influência do
Renascimento em Portugal estende-se de meados do século XV a finais do século XVI. Embora o
Renascimento italiano tenha tido um impacto modesto na arte, os portugueses foram influentes no alargamento da visão do mundo dos europeus, estimulando a curiosidade
humanista.
Como pioneiro da
exploração europeia, Portugal floresceu no final do século XV com as navegações para o oriente, auferindo lucros imensos que fizeram crescer a burguesia comercial e enriquecer a nobreza, permitindo luxos e o cultivar do espírito. O contacto com o Renascimento chegou através da influência de ricos mercadores
italianos e
flamengos que investiam no comércio marítimo. O contato comercial com a
França,
Espanha e
Inglaterra era assíduo, e o intercâmbio cultural se intensificou.
Na arquitetura, os lucros do
comércio de especiarias das primeiras décadas do século XVI financiaram um estilo sumptuoso de transição, que mescla elementos marinhos com o gótico, o
manuelino. O
Mosteiro dos Jerônimos, a
Torre de Belém e a janela do Capítulo do
Convento de Cristo, em
Tomar são os mais conhecidos,
Diogo Boitaca e
Francisco de Arruda os arquitectos. Na pintura destacam-se
Nuno Gonçalves,
Gregório Lopes e
Vasco Fernandes. Na música,
Pedro de Escobar e
Duarte Lobo, além de quatro cancioneiros, entre os quais o
Cancioneiro de Elvas e o
Cancioneiro de Paris.
Na literatura
Sá de Miranda introduziu as formas de
verso italianas;
Garcia de Resende compilou o
Cancioneiro Geral em 1516 e
Bernardim Ribeiro foi pioneiro no
bucolismo.
Gil Vicente fundiu-os com a cultura popular, relatando a mudança dos tempos e
Luís de Camões inscreveu os feitos dos portugueses no poema épico
Os Lusíadas. Em especial a
literatura de viagem floresceu:
João de Barros,
Castanheda,
António Galvão,
Gaspar Correia,
Duarte Barbosa,
Fernão Mendes Pinto, entre outros, descreveram novas terras e foram traduzidos e divulgados pela nova imprensa. Após participar na exploração portuguesa do Brasil, em 1500,
Amerigo Vespucci, agente dos
Medici, cunhou o termo
Novo Mundo.
Espanha
Na Espanha, as circunstâncias foram em vários pontos semelhantes. A
reconquista do território espanhol aos
árabes e o fantástico afluxo de riquezas das colônias americanas, com o intenso intercâmbio comercial e cultural associado, sustentaram uma fase de expansão e enriquecimento sem precedentes da arte local. Artistas como
Alonso Berruguete,
Diego de Siloé,
Tomás Luis de Vitoria,
El Greco,
Pedro Machuca,
Juan Bautista de Toledo,
Cristóbal de Morales,
Garcilaso de la Vega,
Juan de Herrera,
Miguel de Cervantes e muitos mais deixaram obra notável em estilo clássico ou maneirista, mais dramático do que seus modelos italianos, já que o espírito da
Contra-Reforma ali tinha um baluarte e, em escritores sacros como
Teresa de Ávila,
Inácio de Loyola e
João da Cruz, grandes representantes. Particularmente na arquitetura a ornamentação luxuriante se torna típica do estilo que se conhece como
plateresco, uma síntese única de influências góticas, mouriscas e renascentistas. A
Universidade de Salamanca, cujo ensino tinha moldes humanistas, mais a fixação de italianos como
Pellegrino Tibaldi,
Leone Leoni e
Pompeo Leoniinjetaram uma força adicional no processo
O último Renascimento chega a cruzar o oceano e se enraizar na América e no oriente, onde ainda hoje sobrevivem muitos mosteiros e igrejas fundados pelos colonizadores espanhóis em centros do
México e do
Peru, e pelos portugueses no
Brasil, em
Macau e
Goa, alguns deles hoje
Patrimônio da Humanidade
- Exemplo musical
-
-
-
Frontispício da Catedral de
Lima, Peru
Inglaterra
Na
Inglaterra, o Renascimento coincide com a chamada
Era Elisabetana, de grande expansão marítima e de relativa estabilidade interna depois da devastação da longa
Guerra das Rosas, quando se tornou possível pensar em cultura e arte. Como na maior parte dos outros países da Europa, a herança gótica ainda viva mesclou-se com referências da Renascença tardia, mas suas características distintivas são o predomínio da literatura e da música sobre as outras artes, e sua vigência até cerca de
1620. Poetas como
John Donne e
Milton pesquisam novas formas de compreender a fé cristã, e dramaturgos como
Shakespeare e
Marlowe se movem com desenvoltura entre temas centrais da vida humana - a traição, a transcendência, a honra, o amor, a morte - em tragédias célebres como
Romeu e Julieta,
Macbeth,
Otelo (Shakespeare), e
Doutor Fausto (Marlowe), bem como sobre seus aspectos mais prosaicos e ligeiros em fábulas encantadoras como
Sonho de uma noite de verão (Shakespeare). Filósofos como
Francis Bacon descortinam novos limites para o pensamento abstrato e refletem sobre uma sociedade ideal, e na música a escola madrigalesca italiana é assimilada por
Thomas Morley,
Thomas Weelkes,
Orlando Gibbons e muitos outros, adquire um sabor inconfundivelmente local e cria uma tradição que permanece viva até hoje, ao lado de grandes polifonistas sacros como
John Taverner,
William Byrd e
Thomas Tallis, este deixando o famoso
moteto Spem in alium, para quarenta vozes divididas em oito coros, uma composição sem paralelos em sua época pela maestria no manejo de enormes massas vocais. Na arquitetura se destacaram
Robert Smythson e os palladianistas
Richard Boyle,
Edward Lovett Pearce e
Inigo Jones, cuja obra repercutiu até na América do Norte, fazendo discípulos em
George Berkeley,
James Hoban,
Peter Harrison e
Thomas Jefferson.Na pintura o Renascimento foi recebido principalmente através da Alemanha e dos Países Baixos, com a figura maior de
Hans Holbein, florescendo depois com
William Segar,
William Scrots,
Nicholas Hilliard e vários outros mestres da
Escola Tudor.
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Inigo Jones: Queen's House
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- Exemplos musicais
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Críticas
Boa parte do debate moderno em torno do Renascimento tem procurado determinar se ele representou de fato uma melhoria em relação à Idade Média. Seus primeiros comentadores, como
Michelet e
Burckhardt não hesitaram em se posicionar favoravelmente e em considerá-lo uma fase decisiva em direção à modernidade, comparando-o à remoção de um véu dos olhos da humanidade, permitindo-lhe ver claramente
Por outro lado, um grupo de historiadores modernos ressaltou que muitos dos fatores sociais negativos comumente associados à Idade Média - pobreza, perseguições religiosas e políticas - parecem ter piorado nesta era que viu nascerem Maquiavel, as guerras de religião, a corrupção do papado e a intensificação da caça às bruxas no século XVI. Muitas pessoas que viveram na Renascença não a tinham como a "Idade Dourada" que os intelectuais do século XIX imaginaram, mas estavam cientes dos graves problemas sociais e morais, como
Savonarola, que desencadeou um dramático revivalismo religioso no fim do
século XV que causou a destruição de inúmeras obras de arte e enfim o levou à morte na fogueira, e
Filipe II da Espanha, que censurou obras de arte florentinas. Mesmo assim, os intelectuais, artistas e patronos da época que estavam envolvidos na movimentação cultural realmente acreditavam que estavam testemunhando uma nova era que constituía uma ruptura nítida com a idade anterior.
Alguns historiadores
marxistas preferiram descrever o Renascimento em termos materialistas, sustentando que as mudanças em arte, literatura e filosofia eram apenas uma parte da tendência geral de distanciamento da sociedade
feudalista em direção ao capitalismo, que resultou no aparecimento de uma classe burguesa que dispunha de tempo para se devotar às artes.Também se aventou que o recurso aos referenciais clássicos foi naquela época muitas vezes um pretexto para a legitimação dos propósitos da elite, e a inspiração na Roma republicana e principalmente na
Roma imperial teria dado margem à formação de um espírito de competitividade e mercenarismo que os arrivistas usaram para sua escalada social tantas vezes inescrupulosa.
Johan Huizinga reconheceu a existência da Renascença mas questionou se ela representou uma mudança positiva. Em seu livro
The Waning of the Middle Ages ele argumentou que o Renascimento foi um período de declínio em relação à Idade Média, destruindo muitas coisas que eram importantes. Por exemplo, o latim havia conseguido evoluir e manter-se bastante vivo até lá, mas a obsessão pela pureza clássica interrompeu este processo natural e o fez reverter à sua forma clássica.
Robert Lopez declarou que a fase foi de grande recessão econômica, enquanto que
George Sarton e
Lynn Thorndike especulam que talvez o progresso científico realizado tenha sido na verdade bem menos original do que se supõe. Desta forma, muitos historiadores começaram a pensar que o termo Renascimento vinha sendo por demais sobrecarregado com uma apreciação positiva, automaticamente desvalorizando a Idade Média, e propuseram o uso do termo substituto "Primeira Modernidade", de caráter mais neutro e que o estabelecia como uma passagem da Idade Média para Idade Moderna. Mas esses próprios estudos foram objeto de controvérsia, levando a que se chamasse o Renascimento de
"a criança mais intratável da historiografia". Depois do que hoje parece ter ido apenas uma fase de saudáveis questionamentos de conceitos consagrados mas pouco aprofundados, o Renascimento vem sendo reafirmado como um período de enorme importância na história da arte e da cultura ocidental. A quantidade de estudos sobre o tema, que vem aumentando a cada dia, seja a que conclusões tenha chegado, somente pelo seu volume evidencia que o Renascimento é uma polêmica ainda muito viva, e que é rico o bastante para continuar atraindo a atenção da crítica e do público ininterruptamente desde sua fundação
Legado
Mesmo com opiniões divergentes sobre aspectos particulares, hoje parece ser um consenso que o Renascimento foi um período em que muitas crenças arraigadas e tomadas como verdadeiras foram postas em discussão e testadas através de métodos científicos de investigação, inaugurando uma fase em que o predomínio da religião e seus
dogmas deixou de ser absoluto e abriu caminho para o desenvolvimento da ciência e da
tecnologia como hoje as conhecemos. Os filósofos renascentistas foram buscar na antigüidade precedentes para defender o regime republicano e a liberdade humana, atualizando idéias que tiveram um impacto na
jurisprudência e teoria constitucional atuais, e o pensamento político da época pode ter sido uma inspiração importante para a formação de Estados modernos como a Inglaterra e o
Estados Unidos.
No campo das artes visuais foram desenvolvidos recursos que possibilitaram um salto imenso em relação à Idade Média em termos de capacidade de representação do espaço, da natureza e do corpo humano, ressuscitando técnicas que haviam sido perdidas desde a antigüidade e criando outras inéditas a partir dali. A linguagem arquitetônica dos palácios, igrejas e grandes monumentos que foi estabelecida a partir da herança clássica ainda hoje permenece válida e é empregada quando se deseja emprestar dignidade e importância à edificação moderna. Na literatura as línguas vernáculas se tornaram dignas de veicular cultura e conhecimento, e o estudo dos textos dos filósofos greco-romanos disseminou máximas ainda hoje presentes na voz popular e que incentivam valores elevados como o
heroísmo, o espírito público e o
altruísmo, que são peças fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e livre para todos. A reverência pelo passado clássico e pelos seus melhores valores criou uma nova visão sobre a história e fundou a
historiografia moderna, e proveu as bases para a formação de um sistema de ensino que na época se estendeu para além das elites e ainda hoje estrutura o currículo escolar de grande parte do ocidente e sustenta sua ordem social e seus sistemas de governo. Por fim, a fantástica produção artística renascentista que sobrevive em tantos países da Europa continua a atrair multidões de todas as partes do mundo e constitui parte significativa da própria definição de cultura ocidental.